
Na minha última visita a Johanesburgo fui atravessado por uma lufada de ar fresco. Outdoors e empenas da terceira operadora celular daquele País, a Cell C, povoavam literalmente a paisagem urbana com um estílo inconfundivelmente diferente. A Cell C chamou-lhe "A Arte da Comunicação" e para além do enorme sucesso alcançado junto do público, conquistou já importantes prémios de reconhecimento internacional.
Num mercado praticamente dominado pelos gigantes Vodacom e MTN, a Cell C começa a vingar pela irreverência da sua comunicação e principalmente pela coragem de inovar no plano visual. Neste caso, a operadora convidou 35 artistas de renome e maioritariamente locais, lançando-lhes um desafio picantemente saboroso de ilustrar o fenómeno da comunicação.
Preservando fielmente o traço particular de cada artista, a marca assinou as peças com o seu logotipo e apenas colocou uma exigência: que os artistas incluissem a letra "C" na frases usadas para acompanhar cada composição. A Campanha fez uso de duas vertentes, uma destinada à cidade de Johanesburgo, com empenas gigantescas puramente ilustradas e outra abrangente a todo o país, com outdoors num estílo mais clássico e incorporando fotografia. Estas excitantes imagens para além de colorirem e iluminarem a paisagem, conseguiram cumprir o seu propósito principal - o de comunicar não apenas com o potencial consumidor mas com o público em geral.
O seu tratamento foi puro e elementar, reduzindo à essência o conceito de comunicação e devolvendo-o à sociedade da forma mais directa possível. Grandes marcas são geralmente interpretadas friamente, não conseguindo abstrair-se da óbvia necessidade de vender produtos, neste caso a carga emocional das imagens desconstruiu barreiras. Cada painel está de certa forma destinado a um grupo específico, ilustrando as suas acções e atitudes de forma tudo menos plástica. Brincando com esterótipos socialmente construidos que caracterizam grupos comportamentais, a campanha consegue que nos revejamos nas imagens.
A "Arte da Comunicação" não nos impinge mensagens repetitivas, superficiais ou forçadas, nem ilustra produtos, encoraja-nos sim a rever a razão pela qual comunicamos uns com os outros, apelando à emotividade do acto, recordando-nos da proximidade que permite. Deste modo reafirma-nos a necessidade do comunicar e de como cada um de nós possui uma forma distinta mas orgulhosa de o fazer. Ao olhar para a imagem aqui ilustrada, onde um pai diz para o filho "Tem coragem", senti logo vontade de telefonar para casa e falar com o meu filho...e depois pensei...xeque-mate, estes tipos são bestiais! Se vivesse naquele mercado, muito provavelmente também me sentiria motivado a usar esta rede pela simples razão de me identificar com a mesma, porque sabemos que não havendo grandes distinções a nível de oferta, a escolha é motivada na base emocional. E foi isso que a Cell C conseguiu, distribuiu sensações personalizadas. O toque final foi o uso da arte/ilustração que ajudou a digerir, conferindo-lhe bastante destaque e enriquecendo visualmente.
No mercado altamente competitivo e agressivo de hoje, onde o mínimo erro pode levar uma multinacional à falência total, quem tem poder de decisão, fá-lo normalmente com imensa precaução. As marcas apenas se distinguem pela cor ou pelo nome. Paira o receio constante de arriscar inovar, e deitar tudo a perder a favor da concorrência. Para quem trabalha nesta área é encorajador ver uma marca arriscar e provar, tal como a Benetton no passado, que uma grande marca pode despir-se da parafernália corporativa e comercial para ser real, humana, intervir socialmente, marcar posições...e apesar disso conseguir vender no final do dia! Traçando um paralelo com o nosso mercado, sinto que as duas operadoras locais estão a caminho deste propósito, ambas escolheram estratégias de carácter emocional para as suas campanhas institucionais. Isso é positivo, o negativo por outro lado é velho, o de construir a casa ao contrário, pois a imagem deveria espelhar a qualidade do serviço...por vezes nao é esse o caso. Mas olhamos para o futuro com optimismo, porque as mentalidades tendem a mudar.